segunda-feira, 30 de julho de 2012

Já delatou uma bruxa hoje?

Olá!!
Quero mostrar a vocês um pouco do prefácio que fiz para a antologia O Martelo das Bruxas, da editora Argonautas. O texto foi escrito no ano passado e para escrevê-lo usei muito das experiências que tive enquanto escrevia a saga Paganus vários anos antes.=)
Já delatou uma bruxa hoje?
“(...)Pela autoridade com que nos investiu o papa, em virtude da santa obediência e sob a pena de excomunhão, ordenamos e estabelecemos por três admoestações e de modo peremptório a todos e a cada um, laicos, membros do clero secular e do clero regular em qualquer função, grau ou dignidade, que vivam nas terras desta vila- ou desta região- e em um raio de quatro milhas extramuros, que em um prazo de seis dias a contar de hoje, contando cada dois dias como um prazo de intimação, nos digam se sabem, se ouviram dizer que tal pessoa é herege, conhecida como herege, suspeitosa de heresia, ou que fala contra algum artigo da fé, ou contra os sacramentos, ou que não vive como as demais, ou que evita o trato com os crentes ou que invoca aos demônios ou lhes rende cultos. (...)” (EIMERIC, Nicolau. Directorium Inquisitorium (1376) Roma, 1587)
Durante séculos a mão da inquisição levou terror a diferentes paragens, disseminando o medo, a insegurança e a aniquilação daquelas pessoas que, como Eimeric bem disse acima, “não vivem como os demais”. É muito interessante percebermos a marca que esse momento histórico deixou no fino e frágil véu da realidade.
Com o discurso religioso, impregnado de uma “fé verdadeira” e uma crença jovem, hereges eram tratados como simples instrumentos do demônio, fossem eles dissidentes políticos ou seguidores de antigas religiões. Perseguir bruxas tornou-se sinônimo de caçar e calar aqueles que não agem e não discursam como se espera que façam. Entretanto, apesar de todo o esforço para eliminá-los, as bruxas sempre tiveram seu espaço garantido, seja na cultura, na medicina ou no imaginário popular.
Penso na figura da benzedeira que, na minha infância, assemelhava-se às bruxas com suas ervas mágicas, truques para fazer um bebê parar de soluçar - por exemplo - e rezas silenciosas para tirar quebranto, olho-gordo... Na porta da casa de uma delas havia um canteiro com as sete-ervas e uma pimenteira que, segundo ela, iria receber a energia negativa que alguém pudesse estar carregando quando ali chegasse. Não era à toa que tinha alguns infelizes que eram chamados de seca-pimenteira... Pergunto-me se elas faziam alguma magia, pois era incrível como o soluço passava e o bebê se acalmava...
Imagino essas senhorinhas, que eram procuradas por mães aflitas, sendo arrastadas para forcas e fogueiras. Torturadas e humilhadas para que confessassem ter parte com o demônio. E mais, imagino as mães que as procuravam delatando-as quando se sentiam ameaçadas da excomunhão, por que afinal, a grande maioria delas era muito religiosa, praticante.
Para muitos, apontar uma bruxa era uma forma de libertação e ocultação de uma necessidade premente de crer que determinadas situações só podem ser resolvidas com ajuda sobrenatural e alguns artifícios mágicos dos quais se envergonhavam. Conhecedoras da natureza como ninguém mais, as bruxas sempre respeitaram sua força e suas manifestações. Por isso, talvez muitas fossem acusadas de adivinhação, prática condenada pela Igreja, que não compreendia que se tratava apenas da leitura de sinais. Muitas vezes essa prática era interpretada como esconjuro, imprecação, o que levou a muitas afirmações do tipo: Feiticeiras causam danos aos homens através de rituais mágicos e drogas malignas. (Evans- Pritchard, 1937).
Claro que esses rituais fantásticos não encontram nas grandes cidades o espaço necessário para serem realizados a contento. E o campo é o local profícuo para tais eventos. Para a inquisição era certo buscar no campo os suspeitos, atiçar pessoas simples ou sem instrução, que mal tinham o pão, a delatarem ou a confessarem dobrando-se à autoridade e ao poder.
Medo, pobreza, ameaças e castigo, a combinação que visava apontar aqueles não se "enquadravam" nos moldes e padrões sociais, culturais e religiosos, roubando sua paz, esmigalhando seus sonhos e os lançando à fogueira...
Ao escrever esse prefácio, senti um arrepio que correu pela minha espinha. Um presságio? Uma marca deixada pelas minhas ancestrais celtas e xamãs? Não sei, mas senti a mão da inquisição querendo erguer-se novamente, apontando para algumas pessoas e perguntando: Já delatou uma bruxa hoje?
Leiam o livro Paganus e sintam um pouco desse universo. Na bienal de SP, estande J R78.
Simone O. Marques

Um comentário:

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